À medida que a maioria das pessoas cumpre o isolamento social em casa, começam a surgir dúvidas sobre como será o mundo, após o COVID-19. Como reagirá a sociedade às consequências deste isolamento nos próximos meses e início de 2021? Para tal, reunimos as perspetivas de dois investigadores - Gerd Leonhard, conferencista e especialista em tecnologia, e Thomas Frey, conferencista da Google e fundador do DaVinci Institute.
O novo “normal”
O impacto da pandemia de COVID-19 será semelhante à da grande Depressão ou da II Grande Guerra Mundial. Nenhum setor passará incólume. A sociedade, política, ciência, ambiente e economia terão de responder a novos desafios, e haverá uma fatura a pagar na forma de uma crise económica. Gerd Leonhard avança que não vamos reconhecer o mundo em que vivemos antes do COVID-19. Thomas Frey refere ainda que as consequências económicas serão mais graves do que a pandemia em si, conduzindo a uma degradação das condições de vida. De acordo com Frey, esta será a crise mais cara da História. A “pandemia económica” será mais contagiosa do que o Covid-19. O efeito dominó afetará todos os setores e todas as pessoas a nível global. No entanto, há novas oportunidades.
Europa unida
Para Leonhard, as divisões no seio da União Europeia terão de desaparecer. A necessidade vai implicar decisões mais ágeis e a estreita colaboração entre os vários países é a única resposta à crise. Leonhard acredita mesmo a que a Europa ganhará um protagonismo na retoma, fruto de uma “hiper-colaboração” que se estenderá à comunidade científica. Esta colaboração poderá mesmo dar origem a uma Federação de Estados, uma espécie de “Estados Unidos da Europa”, onde o Brexit e a tradicional neutralidade suíça poderão fazer parte do passado.
Todos ligados
Gerd Leonhard fala também de uma “epidemia de isolamento”. À medida que a tecnologia vai encurtando as distâncias entre as pessoas, principalmente entre as famílias e os seus membros mais idosos, novas soluções sociais como a prestação de apoio aos vizinhos mais velhos nas compras, as compras online e o arranjo de avarias em casa vai trazer de volta os cidadãos mais velhos para as rotinas diárias. Leonhard parafraseia o ativista ambiental, Bill McKibben, ao afirmar: “com o Coronavírus, o inferno é não poder contar com os outros”.
Investimento em energia sustentável
Esta será outra das tendências que apontará o caminho do futuro. À medida que o isolamento reduz as emissões de efeitos de gases de estufa, uma das consequências positivas da pandemia, a opinião pública verá, pela primeira vez, o que acontece ao ambiente quando queimamos menos combustíveis fósseis. Thomas Frey diz que, atualmente, estamos em modo “pausa”. Mas que, em termos ambientais, após a crise do COVID-19 haverá um verdadeiro recomeço na forma como consumimos recursos. Leonhard adianta ainda que, em consequência da menor procura de viagens de avião, as indústrias mais poluentes terão de se reinventar, uma vez que os investidores irão apostarão noutras fontes de energia mais sustentáveis.
Menos viagens, mais tecnologia
Uma das opções para muitas empresas foi colocar os seus trabalhadores em teletrabalho. A proliferação de plataformas como o Zoom, Microsoft Teams ou Skype terá um boost nos próximos meses e anos. As viagens de trabalho serão encaradas numa outra perspetiva e preteridas por reuniões à distância através de videochamada, principalmente num período em que a contenção de custos será prioritária, adianta Frey. Por outro lado, o desenvolvimento de tecnologia de holograma fará com que conferências, palestras, aulas e reuniões tenham novas formas.
Salas de aula da era digital
Todos os pais têm assistido a um florescer de soluções tecnológicas na educação dos filhos. Neste momento de isolamento social, os filhos têm aulas em frente ao computador. Mas mesmo que a educação à distância assente em plataformas digitais não seja uma tecnologia nova, a sua disseminação poderá alterar (tal como no mundo laboral) as dinâmicas da sala de aula. Thomas Frey calcula que, no futuro, haja uma complementaridade entre aulas presenciais e aulas à distância. Refere ainda as palavras de Peter Diamandis, fundador da X Prize Foundation, que este é o momento perfeito para “digitalizar, desmaterializar, desmonetizar e democratizar a educação”.
Uma nova paisagem no mundo do trabalho
A capacidade de adaptação das empresas a uma nova realidade tem vários cambiantes. Se, por um lado, dará origem ao crescimento do desemprego, por outro, adianta Thomas Frey, será uma oportunidade para muitos profissionais mudarem de carreira e tornarem-se empresários em nome individual. Quando a recuperação do trabalho se começar a sentir, haverá lugar a novas competências que irão de encontro a necessidades diferentes do mercado. Por outro lado, as empresas que conseguirem manter os seus postos de trabalho vão acordar para uma nova paisagem. As lógicas de teletrabalho que foram impostas por causa do isolamento social vão despoletar novas soluções tecnológicas que dificilmente poderão ser esquecidas no futuro. A interação entre as pessoas será cada vez mais importante, apesar de agora poderem assumir novas formas de comunicação.