Em janeiro último, morreu um dos mais talentosos designers de automóveis que definiu o estilo de uma marca e inspirou-se nos olhos de Sofia Loren para criar um dos seus modelos. Corria o ano de 1960 quando Gérard Welter, então com 18 anos, chegou ao Departamento de Design da Peugeot, numa altura em que os desenhos ainda eram reproduzidos em maquetes de madeira, tornando difícil retocar e corrigir. Mas não demorou muito para que o jovem Welter invertesse essa situação demasiado antiquada.
Munido do seu recente diploma de estucador, Welter mostrou as vantagens de utilizar argila e polietileno na hora de trabalhar algo tão dinâmico e sujeito a alterações como o estilo de um futuro modelo. Esta apetência por inovar aliada a um talento excecional não passou despercebido ao diretor pelo Departamento de Design da marca francesa, Paul Bouvot, que começou por delegar em Gérard a criação de alguns elementos dos futuros modelos, como os faróis traseiros do Peugeot 404 ou os faróis dianteiros do 504 que, segundo o próprio, foram inspirados nos olhos da atriz italiana Sofia Loren. Um olhar felino que durante décadas esteve associado à marca do leão.
E foi com naturalidade que, em 1975, Welter assumiu a direção do Departamento de Estilo da Peugeot. Como responsável pelo design dos modelos da marca, os seus projetos deviam competir com os de Pininfarina que, desde os anos 60, assinou alguns dos mais importantes modelos da Peugeot.
Nos finais da década de 70 a situação económica da marca complicou-se devido à crise do petróleo mas também pelo investimento feito na aquisição da Citroen e da Chrysler para formar o grupo PSA. Foi perante este panorama pouco animador a precisar de algo inovador que voltasse a disparar as vendas e a refrescar a imagem demasiado conservadora da Peugeot, que surgiu o projeto M24 (1977) em que Gérard Welter e a sua equipa de desenhadores estavam decididos a inaugurar uma nova era para a marca do leão mesmo lutando contra a preferência da direção pelas propostas de Pininfarina.
Partindo das linhas angulosas do Peugeot 104, Welter iniciou uma autêntica revolução estilística com uma proposta mais arredondada, sem arestas e com linhas dinâminas para um modelo compacto para o qual desenhou uma grande superfície envidraçada que lhe conferia um aspeto leve quanto agradável. E foi assim que nasceu o 205, um dos mais lendários modelos da Peugeot.
A aposta no 205 tornou-se num êxito comercial chegando a ser o Peugeot mais vendido na história da marca com 5.278.300 de unidades fabricadas entre 1982 e 1998, seguindo-se outros de sucesso como o 206, também recordista de vendas, o Peugeot 207 e o atual 208.
O design moderno do Peugeot 205 manteve-se praticamente inalterável durante os seus 15 anos de vida, antes de ser descontinuada a produção. Muitos dos elementos deste modelo formam parte do “estilo Peugeot”, como a moldura que une os faróis traseiros, ainda presente nos mais recentes lançamentos da marca como o SUV 3008 e 5008 e a berlina 508.
Welter soube ainda expressar no Peugeot 205 a sua grande paixão pelas corridas, cujo estilo se prestou na perfeição para a competição criando escola na marca. Se o 205 GTi conseguiu tornar-se num veículo mítico nas estradas, o Peugeot 205 T16 foi o grande precursor do sucesso desportivo da marca, com duas vitórias no Dakar e outras duas no Campeonato Mundial de Ralis.
Entre 1998 e 2007, Gérard Welter dirigiu o Centro de Design da Peugeot. Período em que a marca aprofundou a sua estética mais desportiva, como demonstram os modelos de última geração, o Peugeot 407 e o RCZ e, acima de tudo, concepts tão espetaculares quanto o Féline, 907, Asphalte, Oxia ou Proxima. Veículos que, como o seu autor, deixaram uma marca inconfundível na história do Leão que sabe mostrar a sua raça.