O Automóvel Club de Portugal lançou hoje uma campanha que alerta para a necessidade de os utilizadores de trotinetas e bicicletas elétricas usarem capacete como medida primária para a sua segurança.
Carlos Barbosa, presidente do ACP, chamou a atenção para o perigo de não se usar capacete, referindo que desde o início do ano houve 74 acidentes com trotinetes. Por outro lado, alertou, os dados da Organização Mundial de Saúde são inequívocos ao apontar que o uso de capacete pode reduzir até 42% o risco de lesões fatais e baixar até 69% as hipóteses de lesões na cabeça.
“As trotinetas não são um brinquedo, são um meio de mobilidade suave que já existe em várias cidades e que não está regulamentado”, disse, adiantando que esta sensibilização destina-se também às empresas que alugam os equipamentos e defendendo que deveriam ter também capacetes para alugar. Segundo o presidente do ACP, nos países civilizados as pessoas usam capacete por uma questão de precaução. Em Portugal, explicou, os utilizadores encaram estes equipamentos como um brinquedo e a Polícia de Segurança Pública “tem as mãos atadas” para fazer cumprir a lei porque existe uma instrução técnica da Autoridade Nacional para a Segurança Rodoviária (ANSR) que torna o seu uso opcional.
O Código da Estrada obrigava ao uso do capacete em velocípedes com motor auxiliar, no caso, bicicletas e trotinetas elétricas. Contudo, uma instrução técnica da Autoridade Nacional para a Segurança Rodoviária (ANSR) em dezembro de 2018 tornou opcional o uso de capacete. Carlos Barbosa classifica de ridícula a decisão da ANSR por se basear numa lei de 1940 quando não era necessário o uso de capacete. “A PSP está de mãos atadas. É lamentável que não possa cumprir a sua missão que é proteger os cidadãos”, frisou.
A campanha nacional “Não sejas Alberto, usa capacete!”, hoje lançada em Lisboa, tem como parceiros a Polícia de Segurança Pública assim como empresas de trotinetas a operar em Portugal. Segundo o sub-intendente Virgílio Sá, da divisão de trânsito da PSP, o facto de as pessoas encararem as trotinetas como um brinquedo leva a que cometam algumas irregularidades, tendo sido ido detetadas várias infrações, entre as quais a condução sob influencia de álcool e a circulação pelo passeio. A PSP alerta assim para o cumprimento das regras de trânsito assim para a necessidade do uso do capacete como medida primária de segurança.
No vídeo promocional da campanha um cientista usa duas melancias para exemplificar o impacto de um acidente com e sem capacete. A uma das melancias o cientista chama de Alberto (a que está sem capacete) e à outra de Inácio (com capacete). Ambas são atiradas contra uma parede verificando-se que “o Alberto” fica esmagado e “o Inácio” mantêm-se intacto. A campanha conta com o apoio da PSP e da Federação Internacional do Automóvel, bem como dos operadores de trotinetas Voi e Bungo.
Capacete reduz até 42% o risco de lesões fatais
Foi com incrível rapidez que as trotinetas elétricas ocuparam o seu lugar na paisagem das cidades portuguesas. Criadas para o chamado “último quilómetro” (Last Mile), permitindo chegar rapidamente a locais onde especificamente os transportes públicos não param à porta, as trotinetas logo cativaram, sobretudo o público mais jovem.
Portugal seguiu assim esta tendência mundial, nascida em 2017 na cidade de Santa Monica, Califórnia. No último ano e meio, as trotinetas espalharam-se por mais de 100 cidades. Paris, por exemplo, “ganhou” mais de 20 mil trotinetas num ano, mas as previsões dizem que vão ser 40 mil em 2020.
Um relatório da National Association of City Transportation Officials revelou que, em 2018, foram realizadas 38,5 milhões de viagens de trotinetas nos Estados Unidos, o equivalente a 46% do total de viagens efetuados em veículos de micromobilidade (trotinetas, etc).
Por cá, se a adesão a este tipo de transporte não deixa dúvidas, na parte da segurança rodoviária há várias questões em aberto, sendo a principal o uso de capacete. Com a possibilidade de atingir velocidades na ordem dos 30km/h, estes veículos circulam entre o trânsito intenso das cidades e até pelos passeios.
E o uso de capacete não é obrigatório, apesar dos dados inequívocos da Organização Mundial de Saúde: proteger a cabeça corretamente quando circula de trotineta ou bicicleta elétricas pode reduzir:
- até 42% o risco de lesões fatais.
- até 69% as hipóteses de lesões na cabeça.
O Código da Estrada obrigava ao uso de capacete em velocípedes com motor auxiliar. A Polícia de Segurança Pública levou a cabo múltiplas ações de fiscalização, nomeadamente no centro de Lisboa, multando aqueles que não traziam o capacete, uma coima entre 60 e 300 euros.
Estas operações stop também visavam as bicicletas elétricas Gira, propriedade da EMEL. Em dezembro, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) emitiu a instrução técnica nº 1 de 2018, para isentar as trotinetas e as bicicletas elétricas da exigência do capacete.
Já em fevereiro de 2019, a PSP dava conta dos resultados da operação “Risco Mínimo”, dirigido às bicicletas e trotinetas, em que foram levantados 528 autos de contraordenação e registadas 618 outras infrações, num total de 1.472 bicicletas e trotineta fiscalizadas. Seis condutores foram detidos por excesso de álcool.
Também o presidente da EMEL, Natal Marques, reconheceu publicamente que o uso do capacete é um “entrave” ao uso deste tipo de veículos.
Sucesso acidentado
A condução destes veículos não deve ser encarada como um ato de diversão. Para os conduzir é preciso ter equilíbrio, força, saber travar, conhecer as regras de circulação e não arriscar. E a realidade mostra que as trotinetas elétricas podem ser fatais.
Em Paris, em junho deste ano, um homem que guiava uma trotineta elétrica morreu após colidir com uma carrinha, naquele que foi o primeiro acidente trágico registada na capital francesa com este tipo de veículos.
Londres também registou uma morte, de novo uma colisão entre uma trotineta, onde seguia a vítima, e uma carrinha, em julho, um acidente que deu muito que falar porque aí morreu uma famosa youtuber.
Dias depois, um rapaz de 14 anos ficou em perigo de vida ao embater a sua trotinetacontra uma paragem de autocarro. No final de 2018, Barcelona contava a primeira morte, uma mulher de 90 anos atropelada por uma trotineta.
Há 3 meses, um estudo das autoridades de Austin, Texas, concluiu que quase 35% das pessoas que se magoaram a andar de trotineta foi logo na primeira viagem. Uma percentagem que subia até aos 63 quando se considerava até 9 viagens de experiência.
Os números ilustram bem a dimensão do sucesso das trotinetas, mas também dos seus eventuais perigos: entre outubro de 2018 e junho de 2019, mais de 6 mil trotinetas invadiram as ruas e os passeios da capital portuguesa.
Em Lisboa, a média estimada é de 13 mil viagens por dia, o que corresponde a quase 400 mil viagens por mês. Calcula-se que já foram efetuadas cerca de 3 milhões de viagens desde outubro.
Cidades travam trotinetas
Também a questão da convivência entre peões e trotinetas, nem sempre pacífica, tomou conta do debate sobre a explosão mundial da micromobilidade. Várias cidades estudam agora formas legais de conter esta “explosão” de trotinetas.
Paris quer restringir as trotinetas e cidades americanas como São Francisco limitaram drasticamente a sua presença. Beverly Hills, em Los Angeles, baniu-as por seis meses. Copenhaga lançou um projeto para testar e medir a reação da população durante um ano, Madrid e Barcelona apertaram as regras.
Curiosamente estão proibidas em Londres e outras cidades britânicas por causa de uma lei de 1835 (que proíbe a circulação no passeio) e outra de 1988, que proíbe a condução destes veículos nas ruas e estradas sem carta de condução, seguro, capacete, impostos rodoviários em dia e matrícula.
Em Portugal, a Câmara de Lisboa anunciou a apreensão de mais de 2200 trotinetas mal estacionadas e coimas num total de 17 mil euros. No Porto ainda não há trotinetas a circular, mas já se sabe quais vão ser as regras, com o novo regulamento a entrar em vigor apenas em outubro: recolher obrigatório para as trotinetas a partir das 22h e não mais do que 700 veículos a operar na cidade.
Vai ser a única a impor limites no número de unidades disponíveis, assim como introduz outra novidade: vai cobrar aos operadores. Paços de Ferreira, Maia, Coimbra e Portimão também já têm, ou estão prestes a ter, trotinetas a circular nas suas ruas. Faro também prepara regulamento, assim como Sintra. Braga, Leiria, Évora e Guimarães devem ser os próximos concelhos a receber estes veículos. Quem já garantiu que não vai deixá-las circular nas suas cidades foram Aveiro e Gaia.