A proposta de Orçamento de Estado para o setor automóvel em 2019 repete a fórmula dos seus antecessores e frustra, novamente, a esperança de uma economia próspera e saudável em linha com os restantes países da União Europeia. É uma mão cheia de ilusões e outra de mais impostos.
Ao manter a carga fiscal sobre o setor automóvel aparentemente inalterada, nalguns casos apenas acompanhando a inflação, esta proposta revela que a austeridade permanece com perspetivas muito pouco animadoras.
Desde logo o aumento encapotado de imposto em sede de IUC comparativamente ao ISV quanto à redução percentual a aplicar às emissões de CO2. Não se entende o porquê de as reduções serem inferiores no IUC face ao ISV, sendo estas uma compensação para a neutralidade fiscal na compra. O que é válido no momento do registo da viatura não é válido para a vida?
A disposição transitória do IUC significa que é válida apenas em 2019? O regime de IUC não foi repensado para albergar três fórmulas de cálculo de imposto? Significa que a partir de 2020 vai haver nova reformulação do IUC ou assumir-se-á a desigualdade fiscal em função do método de homologação de viaturas?
Há ainda a registar uma nota neste aspeto: os consumidores ainda desconhecem qual o método de medição de emissões de CO2 – a proposta de OE revela margens muito diferentes consoante o método aplicado, WLTP ou NEDC, da ordem dos 20%.
Também se mantém a carga fiscal sobre o parque a gasóleo através do adicional ao IUC. E aqui, novamente, a obsessão pela receita rápida, dado que a esmagadora maioria das viaturas em circulação são movidas a gasóleo.
Imposto de selo no crédito dispara
Se a almofada do "fator de correção" para 2019 decorrente do novo sistema de medição de emissões de CO2, a aplicar em sede de ISV é, por si, uma medida não penalizadora para a renovação do parque automóvel – e Portugal tem um dos mais envelhecidos e consequentemente mais poluentes da UE – a outra face da moeda revela um aumento brutal do imposto de selo no crédito ao consumo, da ordem dos 60%. Ou seja, apesar da ilusão, quem quer comprar carro vai pagar mais.
ISP, o grande financiador
Novamente as taxas e os impostos indiretos são os grandes angariadores de receita, com o Imposto sobre Produtos Petrolíferos à cabeça. Mais uma vez, a ilusão comanda a realidade das contas, com o adicional ao ISP a manter-se inalterado.
Incentivo ao abate na gaveta
A proposta de OE para 2019 mantem na gaveta o incentivo ao abate de viaturas em fim de vida e a consequente renovação do parque automóvel. O mesmo se regista para os veículos híbridos e os de combustão mais limpos.
Cosmética para elétricos
Neste capítulo, os incentivos são proclamados, mas inócuos. Mantendo-se, só são válidos para as primeiras mil viaturas e, mesmo assim, inferiores a 2500 euros.
Bens e serviços mais caros
Não se vislumbram medidas reais de incentivo às empresas, muito pelo contrário. Carregar no imposto sobre o parque automóvel das empresas é mais uma fonte de receita garantida para o Estado. Com lucros ou não, todas as empresas têm viaturas que precisam para o seu serviço, ficando agora à mercê de mais um garrote fiscal. O resultado, tal como decorre do IUC e do ISP, será também um aumento generalizado dos bens e serviços que atingirá todos os contribuintes sem exceção.
Passes sem transportes de qualidade
A obsessão com a receita surge neste Orçamento de Estado acompanhada de uma medida eleitoralista. Alocam-se 83 milhões de euros para financiar a redução dos passes dos transportes públicos, mas não se conhecem investimentos nesses transportes ou numa rede integrada e eficiente nas áreas metropolitanas.
A par disto, mais dois fatores: a absoluta falta de políticas de mobilidade e a rejeição dos transportes públicos pelos consumidores. Os portugueses são os europeus que menos utilizam os transportes públicos pelo mau serviço prestado, sendo que o preço não é decisivo na hora da escolha. Com esta proposta de Orçamento, todos os contribuintes vão pagar a redução do preço dos passes para continuarem a ser mal servidos.
Lisboa,16 de outubro de 2018.